Foi a primeira obra da Clarice que eu toquei. Confesso que demorei pra conseguir ler - muitas vezes peguei o livro, li algumas páginas e acabei largando; nunca consegui passar do prolongado monólogo de Rodrigo S.M. (na verdade Clarice) sobre sua vida e sua relutância em escrever o livro. Eu achava essa parte desnecessária e ansiava pelo verdadeiro início da história.

Bem, li o livro agora e vejo o quão importante essa parte foi. O narrador Rodrigo S.M. não se limita a somente narrar os fatos, mas constantemente opina e comenta sobre a história - seja pra rechaçar a protagonista, para demonstrar a ela afeto ou até para falar sobre suas semelhanças com ela. Evidentemente Clarice se espelhou em Macabéa de uma forma ou outra. E falando em Macabéa, tantas páginas de caracterização da personagem valeram a pena, raramente eu me simpatizo tanto com um personagem quanto eu me simpatizei com Macabéa e sua história tragicômica. Clarice Lispector tem um jeito muito peculiar de escrever, o qual leva tempo para se acostumar, mas toda essa estranheza vale a pena no fim. Clarice transforma palavra em arte, sua língua é popular e flúida, mas ao mesmo tempo carrega consigo um leque imensurável de emoções. É uma leitura estranha a princípio, mas que com certeza valeu a pena.